por Raquel Ritter Longhi.

A plataformização do jornalismo encontrou no TikTok mais um espaço, depois que uma grande quantidade de veículos ocupa de maneira intensa outras plataformas.

Do perfil da Agência Lupa no TikTok (captura de tela)

A questão do jornalismo no TikTok é instigante, e provavelmente não é a primeira vez que alguém faz a pergunta do título. Mas certamente ela é bastante pertinente num momento em que a rede chinesa invejada por Mark Zuckerberg e ameaçada pelo ex e (felizmente não reeleito) presidente Donald Trump voa alto no cenário das mídias sociais.

A plataformização do jornalismo encontrou no TikTok mais um espaço, depois que uma grande quantidade de veículos já ocupa intensamente Snapchat, Facebook, Instagram, e YouTube, só para citar alguns. O Brasil está entre os maiores públicos usuários do TikTok. EstadãoFolha de S. PauloJornal Meia HoraJornal da RecordAgência Lupa e o Diário do Rio são alguns dos (poucos) veículos que já possuem seus perfis no aplicativo, ainda que somente o Estadão e a Folha estejam usando a plataforma para fazer jornalismo. O primeiro, com mais tempo na plataforma, parece já ter atingido um certo nível expressivo, enquanto o segundo, que entrou recentemente, ainda está engatinhando nos seus conteúdos. Já o Jornal da Record tem feito um uso “misto”, por assim dizer, conjugando vídeos institucionais e de bastidores, esse sim, formato que parece ser o mais utilizado, como o do Diário do Rio. Também presentes, agências de checagem, como a Lupa. Isso ainda é pouco, para um país das dimensões do nosso e dado o imenso público usuário da plataforma. Em outros países, organizações como NBCUSA TodayESPN, a Vice, o The Washington Post e o The TelegraphLa NaciónLe Monde, dentre outros, parecem fazer um uso mais profissional.

O tema exige, ainda, pensar em questões éticas, como observou o pesquisador Ricardo Torres, do objETHOS, no artigo “É cedo para estabelecer definições sobre a relação entre jornalismo e TikTok”, disse que “a ascensão do caso TikTok (…) fez alguns jornalistas refletirem sobre a segurança e a ética ligada ao uso e à promoção destas plataformas”, e observa que, sim, é pouca a utilização do aplicativo até agora:

O TikTok é utilizado de maneira ínfima por jornalistas e meios de comunicação para alcançar públicos próprios. No entanto, como indica Bell (2020), é difícil imaginar como jornalistas especializados em tecnologia ou cultura podem não gastar pelo menos algum tempo em um aplicativo que foi baixado bilhões de vezes e está crescendo muito rápido em popularidade.(TORRES, 2020)

Se a questão é uso abusivo, há boas notícias que vêm das plataformas, além dos recentes banimentos de Trump e de Olavo de Carvalho (este, temporariamente) por algumas delas. O TikTok derrubou 7,5 milhões de vídeos no Brasil no segundo semestre de 2020, reforça uma notícia publicada pela Folha de S. Paulo recentemente, por “violaram as políticas de uso da empresa, que incluem nudez e conteúdo sexual, assédio e bullying, discurso de ódio, atividades ilegais, segurança de menores, suicídio e extremismo violento, entre outros”. Tudo isso mostra que finalmente, os aplicativos estão barrando usos indevidos e abusivos.

EXPERIÊNCIA, ENTRETENIMENTO, EMOÇÃO

Conteúdos no TikTok podem parecer infantis, principalmente aqueles mais ligados ao entretenimento, como as dancinhas, mas aos poucos o jornalismo parece estar aprendendo a usar as possibilidades expressivas nativas da ferramenta para criar suas histórias. Essa estética que conjuga o entretenimento com a emoção, porém, confirma o que preconizava o professor Alfred Hermida, no final de 2015. Ele falava dos cinco “es” do jornalismo que estava por vir. Já falei sobre o “e” da experiência (LONGHI, 2017; 2018) (LONGHI e CAETANO, 2019; LONGHI, 2020), mas quando o tema é o TikTok, na esteira de seus contemporâneos Twitter, Instagram e Facebook, para citar apenas três, um dos outros “es” que anunciava o autor aparece com força: o “e” de jornalismo emocional. Abro aspas para o autor:

As mídias sociais impulsionaram a mudança para o jornalismo emocional: as interações das pessoas nas mídias sociais se prestam a histórias que tocam um acorde, pois as emoções são poderosas motivadoras do compartilhamento. A mídia social fornece canais para o público compartilhar alegria com os outros, participar de um coro de indignação ou lamentar-se após eventos como os ataques de Paris. Com o surgimento das descobertas e recomendações sociais, os jornalistas estão trabalhando cada vez mais em um espaço em que as pessoas não compartilham tanto informações, mas compartilham um sentimento. (HERMIDA, 2016, s/nº)

Quando vemos o jornalismo utilizar-se de ferramentas como os Stories, do Instagram, algo que começou ainda com o Snapchat há alguns anos, e hoje, com a explosão do TikTok, a questão do jornalismo emocional emerge de forma bastante intensa. Shira Ovide, colunista do New York Times, têm escrito sobre o Tik Tok de forma sistemática, acompanhando a trajetória da plataforma. Em julho de 2020, ela já chamava a atenção para o futuro do aplicativo:

O TikTok parece familiar, mas sua alma é diferente da de outras mídias sociais que vieram antes dele. Pode ser divertido, mas também é uma força para prestar atenção. O TikTok é a primeira potência de entretenimento nascida e construída para a era dos smartphones — e pode mudar tudo. (OVIDE, 2020, s/nº)

Para ela, o TikTok pode estar reconectando o entretenimento, dando à próxima geração de ativistas novas maneiras de contar histórias e desafiando a ordem global da Internet.

Em meados de 2020, no workshop “Como os jornalistas podem usar o TikTok para encontrar histórias e monitorar a desinformação”, no Simpósio Internacional de Jornalismo Online da Universidade do Texas, o ISOJ, Laura Garcia mostrou por que o jornalismo deve se preocupar com o TikTok, opinião da qual compartilho:

Jornalismo é sobre pessoas, e isso significa que precisamos entender as comunidades sobre as quais escrevemos e que queremos levar nosso jornalismo independentemente de onde eles morem, sejam grupos do Facebook … ou uma comunidade que troque informações sobre TikTok.

Há poucos dias a Rolling Stones publicou sobre o futuro do jornalismo de música na plataforma, afirmando que é um espaço a ser explorado. Perfis como MostleyMusicLoveinamovie e Hahakcoolgottagobye “prosperaram durante a quarentena e ajudam a base massiva e jovem de usuários do TikTok a peneirar o número incontável de músicas que são adicionadas diariamente às plataformas de streaming”, ressaltava o artigo. Observava ainda que, pelo fato de estar inserido em um sistema criado para gerar conteúdo viral, o TikTok é uma ferramenta instantânea para a divulgação de música.

Ainda é pequeno o número de pesquisadores que têm no TikTok objeto de pesquisa, especialmente no caso brasileiro. Entretanto, já é possível encontrar boas surpresas, como o TCC Jornalismo no TikTok, de Ian Alves, trabalho de conclusão de Curso da ECA/USP, orientado pela Professora Beth Saad. Ian faz um site bastante completo com tudo o que queremos saber sobre o aplicativo e o jornalismo até agora, desde adaptação à linguagem até estudos de três casos de jornais de legado na plataforma. E foi lá que encontrei uma lista colaborativa sobre perfis de jornais e jornalistas no TikTok, que dá uma ideia de como está indo o processo de adoção do aplicativo pelo Jornalismo. Já adicionei alguns perfis brasileiros que ainda não estavam lá!

Este texto foi originalmente publicado no medium do Nephi-Jor em 28/02/2021

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