uma visão sobre o uso da imersão no jornalismo

Por Marina Oliveto

O mundo está mudando e, o jornalismo, também. Os rumos que ele está tomando é que ainda são incertos, já que tudo se move para uma nova direção ao aparecerem as novidades tecnológicas. Mas é claro, basta analisar os grandes players do mercado — New York Times, BBC, Washington Post, entre outros –, que é possível ter uma noção dos ventos.

Assim, podemos enxergar que os caminhos nos levam para um jornalismo mais imersivo, interativo, mais participativo, sendo a inovação o ingrediente essencial para esta narrativa que está sendo construída. Mas, tudo isso vem exatamente na contramão das redações. No momento que investimentos em tecnologia deveriam ser prioridade, os veículos de comunicação estão cada vez mais quebrados, reduzindo custos e equipes, tentando fazer o máximo, com o menor investimento possível.

Pensando no jornalismo que está sendo construído, as condições atuais das redações não será um grande problema para que ele seja absorvido e se torne uma rotina. O dilema da imersão e da adoção de qualquer outra novidade tecnológica no jornalismo é outro: as vantagens para o usuário, que será o ponto de virada para esta história.

Afinal, como já vimos na história da comunicação e, consequentemente, do jornalismo, sempre que existe algo de novo para usuário — outrora conhecido como telespectador, leitor, ouvinte –, que seja capaz de tirar a pessoa da zona de conforto e que promova maior integração com as expectativas, por si só, a mudança acontece de forma inesperada.

Mas isso já não deveria ter acontecido? As pessoas já se deslumbraram com as sensações da produção de conteúdo jornalístico em realidade virtual e por meio dos vídeos 360º, já se conscientizaram que o experienciar e o “estar lá” promovidos pela imersão são geradores de empatia e capazes de nos fazer assimilar de forma muito mais real os fatos que estão sendo narrados.

Tal vivência em primeira pessoa deve ser considerada apenas no modo de sentir-se interagindo com o fato, mas, em sua estrutura, a narrativa desenvolvida é suscetível de ser enunciada em discurso direto, que confere ao usuário a sensação de protagonismo, ou em terceira pessoa, por meio de discurso indireto, com vozes delegadas a vários personagens, combinadas harmônica ou polemicamente em rede de controvérsias (LATOUR, 2012).

Então, por que o New York Times se distanciou do conteúdo em VR e 360º? Um dos veículos de comunicação mais importantes da história do jornalismo mudou os ventos começou a transitar por mundos imersivos, mas sem usar os graus de liberdade promovidos pela imersão?

Pelos acessórios caros e cada vez mais dotados de tecnologia que estes conteúdos necessitam para promover todas as sensações descritas. Porque o encantamento e entusiasmo, não foram o suficiente para movimentar o mercado, a fim de tornar estes gadgets tão populares quanto os fones de ouvido que são parte imprescindível dos nossos smartphones.

Mas e a experiência, ela não terá condições de se sobrepor a esta barreira? Quem sabe, em breve. No entanto, vai depender muito daqueles que produzem este conteúdo. Jornalistas profissionais, destemidos e que querem restaurar a reputação do jornalismo, que passa por uma grave crise de confiança e a credibilidade que se instaurou diante do imediatismo das redes sociais.

Quando o conteúdo é bem concebido, criado de forma a tirar o usuário do seu papel habitual, de consumidor de notícias passivo, é possível inverter a maré pela qual o jornalismo está sendo levado. O jornalista deve desocupar o lugar de detentor da informação e, passar a intermediar as condições de informação, criando um diálogo entre o público e os personagens, tornando mais reflexiva e transformadora a experiência de “vivenciar uma notícia”.

É preciso olhar com mais atenção como alguns museus estão utilizando as tecnologias imersivas, para entender o comportamento do usuário — consumidor de notícias –, e como está se transformando a recepção deste conteúdo. Desde 2017, o Illinois Holocaust Museum conta com a exibição permanente Take a Stand Center, na qual o público vai até o auditório e lá é possível conversar com um dos 13 sobreviventes do Holocausto.

Visitantes assistindo e fazendo suas perguntas para o holograma de Aaron Elster. Foto: Robert F. Kusel
A gravação de uma das sobreviventes para recriar o holograma. Foto: Illinois Holocaust Museum & Education Center

Seria muito simples, se tudo isso não acontecesse a partir de Inteligência Artificial e a reprodução de hologramas. Afinal, nenhum destes sobreviventes está no museu e, em sua maioria, eles já faleceram. Então, as perguntas feitas rapidamente são processadas e geradas a partir de um arquivo de milhares de horas de gravação com os sobreviventes. Assim, a pessoa real — mesmo que não seja de carne e osso — está sentada a frente do público e responde como se fosse uma conversa real, o que não é, apenas por um detalhe.

Voltando ao New York times, que mostrou ao mundo como é possível contar histórias imersivas com o uso de câmeras 360º, eles não abandonaram a ideia da experiência — e nem deveriam, já que este é o caminho no qual o jornalismo está seguindo –, mas, criaram formatos que aumentem a interação, imersão e participação no experienciar uma notícia. Segundo a definição do próprio NYT, See How the World’s Most Polluted Air Compares With Your City’s é “um projeto especial que adiciona uma camada de dados geolocalização ao mundo real que visualiza essa poluição prejudicial, mas geralmente invisível”[1].

Printscreen do mapa com a poluição. Fonte New York Times

O que nos diz este projeto do NYT? Que o futuro do jornalismo é a entrega da conteúdos cada vez mais completos, recheados de dados, interativos e imersivos.

Com a internet, foi proporcionado ao jornalismo um mundo de experimentações narrativas. Os vídeos em 360 graus, webdocumentários, newsgames, infografias interativas e a grande reportagem multimídia são apenas alguns dos exemplares da evolução dos produtos noticiosos (Costa, 2018).

Resultados assim são muito promissores e, com toda certeza, fazem a diferença na vida dos visitantes que estão dentro do museu. Mas, como trazer isso para o jornalismo? Estes são os passos necessários para os pesquisadores seguirem, buscando respostas em ambientes virtuais, aumentados, hologramas, Inteligência Artificial, como forma de entregar conteúdo de qualidade e credibilidade para o público. Aliás, isso é o que o New York Times tem feito ao longo dos anos, com erros e acertos, mas apostando na inovação.

Portanto, muito do que se viu ao longo destes últimos cinco anos deve se reinventar, somar forças e reescrever a história do jornalismo. Esta é a minha aposta, qual é a sua?

Referências bibliográficas

Costa, L. (2018). O jornalismo imersivo como experiência do acontecimento. 16º SBPJOR. Acesso em 17 de maio de 2021. http://sbpjor.org.br/congresso/index.php/sbpjor/sbpjor2018/paper/viewFile/1259/735

Latour, B. (2010). Reagregando o social: uma introdução à teoria do ator-rede. Salvador: EDUFBA-Edusc.

See How the World’s Most Polluted Air Compares With Your City’s. (2020). Online Journalism Awards 2020. Acesso em 17 de maio de 2021. https://www.nytimes.com/interactive/2019/12/02/climate/air-pollution-compare-ar-ul.html.

Illinois Holocausto Museum. Take a Stand Center. Acesso em 17 de maio de 2021. https://www.ilholocaustmuseum.org/tas/

[1] NYT — Inscrição do Online Journalism Awards 2020. A produção do New York Times foi a vencedora do prêmio na categoria Excellence in Immersive Storyteling.

Este texto foi originalmente publicado no medium do Nephi-Jor.

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